sábado, 12 de novembro de 2011

A escrita está cheia de atributos retóricos. Bem, não só a escrita. Também a minha fala está cheia de truques, e tão potente é escrever como se fala, e falar como se escreve. Ainda assim, a fala consegue irradiar uma explosão de emoções, que apesar de mais restrita que os sentidos da escrita, é claramente muito mais hiperbólica e brutal, capaz de com um tom diferente, rebentar com um castelo de expectativas e levar a um estado de estranheza monstruoso, capaz de transformar momentos antes e após uma frase, como realidades incompatíveis, apenas relacionáveis pela ponte feita pela frase que congrega as partes, mas que quebra a linearidade.
Costumo resistir a estes rios de sentido, tentando abrigar-me à beira do penhasco, mas nunca caindo no fundo do rio. Hoje, senti um prazer enorme no salto que dei para dentro do rio - despenhei-me na explosão vulcânica da irritação do duplo constrangimento. Ter duas forças monstras a penderem-me para lugares opostos e ter de agradar a todas começa a ser tarefa árdua, e a projecção na mais fraca torna-se por vezes, o caminho mais honesto, se bem que mais destrutivo, em vez de uma conservação magmática de emoções, que sinto só me prejudicarem visto o prazer da explosão, da queda no rio ter um sabor luxuriante, embora tendo consequências mais dolorosas, tanto para mim como para os demais, envolvendo depois, não só um cuidado cirúrgico comigo, mas uma certa reestruturação, daquilo que prazeirozamente foi deitado abaixo. O dilema passa por analisar quais as forças mais fortes, e como reagir às mesmas. Se resistindo sempre, ou se explodindo numa postura que apesar de bipolar, é a mais honesta, e mais destrutiva. Será que haverá sempre possibilidade de concertar? O desrespeito por mim será ou não um desrespeito pelo outro? Ou a explosão no outro não será uma forma de mostrar que as fronteiras existem e que há territórios sensíveis, de onde se expele uma lava brutal, de onde é impossível resistir à queda do rio?
Esta metáfora do rio e do vulcão é deliciosa. Por um lado, o rio refresca-nos, isto é, oferece-nos uma certa hipotermia, mas ao mesmo tempo, o calor explosivo dos vulcões tem um brilho esplendoroso por ser uma força temível, mas ao mesmo tempo tão sincera, que provoca medo, estranheza, capaz de tornar uma floresta maravilhosa em cinza. A existência entre picos explosivos e uma linearidade, é caminho, movimento. Vivemos ligados a passagens, a explosões que nos fazem entrar na riqueza hídrica de um rio, que debaixo de água nada noz diz sobre a imensidão da nova margem, por muito doloroso que possa ser não só andar debaixo de água, como subir as primeiras pedras do penhasco na margem desconhecida. Ficar preso ao medo por vezes é uma opção óptima. Evita-se o risco, as respostas são certas, mas do outro lado do rio, depois da explosão, certamente encontraremos novas fontes de sentido para uma vida que se pretende um constante abordar de pontos de vista, de modo a alcançar-se uma qualidade de vida, que para lá de uma produção de atributos de bem-estar externos ao corpo, é não mais que a tentativa-erro, no arriscar de vida, procurando ser o mais verosímil que possa, e compreendendo as limitações da convivência com palavra, que, limitadamente, tenta traduzir aquilo que são estados explosivos, anteriores à cratera vulcânica, que se encontram nas profundezas no rio da vida; no inconsciente que brota a cada vez que os medos do medo se ausentam.

domingo, 23 de outubro de 2011

Perspectiva e o fim da Teologia

Mostrar indignação é uma delicia. Adoro refilar, criticar! É de um prazer visceral sobrevalorizar o meu ponto de vista e tiranizar-me a uma só maneira de ver, centrando-me no meu narcisismo, universalizando o meu eu, numa unidade absoluta e incorruptível de verdade!Há dias em que me sinto Deus, creio tanto em mim, que tenho a sensação de que a minha maneira de ver é divina, e seria impensável pensar sequer noutra óptica! Que boas são as minhas lentes, como gosto da aquisição que fiz no Grande Oftalmologista.
Ainda me pergunto se por agora mudarei só as astes, ou se, quem sabe, não mudarei de lentes para de novo reformular a minha visão do mundo! A mudança de lentes é terrivel, é um questionamento enorme pensar em rever o mundo de outra forma, e a minha óptica teológica, passará a ser um politeísmo, alcançável com um exercicio hermeneutico apenas mudando a postura, angulando mais para cima, mais para baixo.

sábado, 4 de junho de 2011

Há um ciclo de problemas! Este blogue é um caixote de incertezas. Nada como me refugiar na escrita para expressar aquilo que não consigo entender. Será que a escrita que me transmite algo que em pensamento não consigo entender?! Esta dúvida é caduca. Mas é delimitada por uma constatação de que ela deixa de ser hipótese, e passa a ganhar uma certa consistência - a Escrita tem propriedades próprias. A escrita é um registo interessante. Ainda que limitada por filtrar muito daquilo que é a emoção, e que é impossível de passar com os dedos, ela constitui-se como marco, que pode ser visto e revisto. Ainda que não tenha a capacidade de ser expressão total do sentido do escrevente, ela autonomiza-se do próprio pensamento, garantindo-se assim, sendo memória constituída e sentido de texto, que se vê alienado do próprio escritor.
Afinal, a escrita usa-me. Ela apodera-se do pensamento objectivado e a partir dele, faz o que bem entende. Já não sirvo para nada. Aquilo que acontece é que chego a surpreender-me com o que escrevo, e passado algum um tempo, o meu Eu é confrontado com o Eu da escrita. Por vezes o confronto é de tal modo arrebatador que o leitor ao ler-se entra num movimento de perplexidade e de inconsistência absoluta por duelo com o escrito. E quem sou eu afinal?! O escrito ou o meu Eu subjectivo, não objectivado pela escrita.
A noção de consistência absoluta do ser põe-se em causa. O Eu é atravessado todos os dias. Como pode permanecer igual?! Serei eu uma amostra de texto, ou antes o texto que me pode mostrar? Podia ser se eu chegasse ao fim e a mim dimensão teleológica estivesse obtida com uma noção de sentido ultimo fundamentada com o final da minha vida. "Combati um bom combate, terminei a minha carreira" seria a suma da produção textual, e poder-se-ia perguntar qual a utilidade de escrever antes, se o depois pode confirmar o diferente. As nossas bibliotecas de sentido certamente ficariam vazias se nos cingíssemos a uma noção de final e finalidade tentando propor como teleologia final, o fim da vida, onde um trabalho de auto-reflexão seria condição suficiente para a compreensão da totalidade da existência.
Continuo com uma ausência de resposta. Parece-me que a teleologia é importante enquanto construtora de luzes no final de túneis tumultuosos, mas falta construir esses túneis que são nada mais que estruturas rochosas que ao longo da nossa vida vão sendo moldadas com vista a essa noção final. Ainda assim, ficamos na duvida. Qual será a importância de constituir um final, quando tudo o que fizemos nada correspondeu a esse idealismo. E não haverão pessoas que são suficientemente consistentes na inconsistência e cuja vida não é mais que uma total mudança de direcção que as coloca numa direcção desnorteada, mas que não deixa de ser uma certa noção radical de caminho. Afinal, esta desarticulação narrativa, sem finalidade,poderia ser considerada numa visão radical de ódio aos indecisos ou aqueles que nunca sabem para onde vão, e se sequer é essa a sua vontade.
Que poderemos afirmar? O escrito é testamento teleológico e é um serviço diário! Ou é antes uma homilia bonita no final da vida, onde a santa unção redime o que se fez, e o que se não fez, e onde se procura mais uma vez a redenção como forma de encontrar um novo espaço?! A construção da vida é exercício diário?!Pelo sim pelo não escrevamos.